O frentista que me deu a Bíblia

Estava em São Bernardo, se não me engano. Fim de tarde, já havia feito o que tinha que fazer (e não me lembro do quê exatamente). Bora abastecer o carro e voltar pra São Paulo. Encontrei um posto de gasolina próximo ao retorno, estacionei, e enquanto esperava fora do carro o frentista veio puxar papo comigo…

– Esse trânsito tá foda – ele disse.
– Pois é, não tá fácil pra ninguém.
– Trânsito, essa gente mal-educada, estressada, povo estranho esse sem paciência.
– Pois é, nego fala o que der na telha, e a gente que não tem nada com isso que se foda.
– É rapaz! Eu ouço cada coisa aqui que você não faz ideia… pra acalmar, eu dou uma respirada e procuro a coisa certa a fazer, ao invés de sair por aí fazendo igual, sacomé? Ó, se você quiser, dá uma lida aqui no meio do trânsito quando nego vier te encher o saco – abre qualquer página e lê que ajuda. Leva que você é gente boa.

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E me deu uma biblinha. Mirim. É o que tá escrito na capa. Guardei no bolso e agradeci pela gentileza, mesmo sendo completamente avesso ao livro em questão, ali estava um cara de bom coração e boas intenções: a biblinha podia ser um copo d’água, um sabão no vidro do carro, uma calibrada de pneu, um desconto na gasolina. Mas era esse o presente  dele, e seria uma baita grosseria recusar. Acabei de encontrá-la, em meio à bagunça na arrumação do escritório. Sim, a biblinha do cara do posto continua comigo, e eu vou guardá-la naquela caixa de memórias que todo mundo tem, pois a recordação que eu tenho dela é a de um papo tranquilo com um cara que nunca havia visto a minha cara, que não se preocupou com o que eu iria achar, fazer ou dizer sobre aquilo, mas que achou por bem me fazer um agrado porque “eu sou gente boa”.

Sem forçar a barra. O ser humano ainda tem jeito quando aquilo que nego vive pregando besta e gratuitamente por aí (quase sempre da boca pra fora) sai naturalmente de dentro do peito de uma pessoa de bem. Ninguém duvida da validade da mensagem: o que a gente duvida mesmo é da validade das pessoas.

Dá pra acreditar.

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