O que aprendi sendo síndico por 2 meses

Dezembro de 2015 e janeiro de 2016 foram meses especiais pra mim. Com a viagem da síndica e minha atual função no conselho, assumi a bucha de ser o responsável pelo prédio, e todos os assuntos que o envolvem. Criei até o tópíco #‎diariodeumsubsindicoemapuros‬ no Facebook, pra lidar da forma mais bem-humorada possível com isso. Hoje, com o retorno da síndica, essa passagem da minha vida passa de situação a história, e deixa algumas lições pelo caminho.

1) A maioria das pessoas é boa

Encontrei gente muito legal por aqui. Gente que nem conhecia, e que se habilitou a ajudar nos problemas do prédio, fosse sugerindo melhorias, fosse saindo no meio da noite pra me ajudar a normalizar um mal funcionamento das bombas d’água. Os porteiros e funcionários, que antes eram tão mal-falados pelo então síndico (que já estava no cargo há 11 anos) foram prestativos de uma forma que não consigo mensurar. Assim como os funcionários da administradora do condomínio, que fizeram sua parte direitinho.

Sim, ninguém é herói sozinho. Eu tenho bons vizinhos, e gente do bem me cercando.

2) Porém, quem sobressai sempre é aquela meia-dúzia de FDP

Obviamente, nem tudo são flores. Tem o bêbado que trabalha na polícia que chega em casa e deixa porta do elevador travada, destrói quadro de avisos, tem o vizinho que acha que você é porteiro e te enche o saco pra fazer coisa que não é tua função, tem a velhinha carente que te liga pra reclamar de qualquer coisa, tem o ex-síndico que acha que dá pra continuar dando jeitinho nas coisas – mesmo numa nova administração, e quando você se recusa a entrar na maracutaia, é tratado como pedaço de merda. Os reclamões SEMPRE sobresaem, justamente por serem reclamões, e fazerem surgir na gente aquilo que temos de pior.

Aquilo que temos de pior pesa. Cansa. Desgasta e envelhece. Se bobear, vira câncer. Tem gente que gosta desse movimento. Eu pago pra não fazer parte dele.

3) A gente é mais capaz do que imagina

Foram apenas 60 dias. O suficiente pra eu aprender como funciona o sistema de bombas d’água do prédio, a fiação do elevador, o sistema de circuito interno, e conhecer quem faz o quê no prédio. O que deixa cada vez mais claro pra mim que, na hora em que a água bate na bunda, nossa cabeça funciona melhor. E funciona, a não ser que fugir seja uma opção – coisa que pra muita gente é.

4) Manter o bom humor é essencial, em qualquer circunstância

Mesmo com tão pouco tempo na linha de frente, deu pra sentir o peso da coisa. Se eu levasse pro pessoal cada pepino que pintou por aqui (e meus amigos, daria pra fazer uma salada pra família inteira) não olhava mais pra cara de ninguém. Mas separando as coisas, dá pra dizer que esse período foi bom. Deu pra tomar algumas liberdades, como liberar uma piscininha pra molecada, fazer um escambo do bem com a escala dos porteiros (para que o cara pudesse encontrar a esposa sem ter o salário descontado), pegar o contato do cara que conserta o elevador (e que em dez minutos de papo saber que o cara também vende peixe fresco, tem um sítio e convidou a gente pra almoçar dia desses), e pesquisar preço de bicicleta pro auxiliar de serviços gerais. Fora botar a vadiagem na linha.

Conclusão:

Eu acho que o prédio é um microcosmo bem representativo do mundo em que a gente vive. Uma experiência extremamente válida, que escancarou um novo universo bem na minha cara. Calçar o sapato alheio SEMPRE te transforma, e a gente cresce, amadurece e entende um pouco mais do ser humano. Foi bom, e eu curti mais do que esperava.

Gostaria de agradecer primeiramente…

Há alguns meses, tivemos uma ideia durante um papo na cozinha. Um papo mais profundo do que parecia naquele momento: “o que você REALMENTE gosta de fazer da vida?”. Não tinha nada a ver com o comercial do Pão de Açúcar… tinha, mas não tinha, não com o mesmo intuito marqueteiro. Mas encontrar a essência, essa coisa que te faz feliz de fato é um trabalhão- ainda mais se essa resposta te parecer nebulosa mesmo após algumas décadas.

Mas era, e a Dé declarou que viajar era o que a fazia feliz de fato.

Nenhuma novidade pra mim. Mas o que fazer com essa informação? Como transformar isso em resultado, e que resultado seria esse? Dinheiro? Contatos? Mais viagens? Um passatempo? Por sorte (e por competência – sim, em cima de tanta cumplicidade existe um trabalho de casal daqueles – e de comunicação, que facilita muito a coisa toda) a gente evoluiu o papo, e aos poucos esboçamos um projeto. Fizemos alguns testes, uma ou outra pesquisa, batemos muito papo, e a coisa foi tomando forma. Quando tínhamos barro suficiente, chegou a hora de botarmos a mão na massa e fazermos esse monte de informação virar alguma coisa de fato. E fizemos.

Botamos o vaso na vitrine hoje.

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Se há uma coisa que eu aprendi com a Dé é que existe hora pra tudo nessa vida – hora inclusive pra calar a boca e trabalhar. Durante essas últimas semanas foi esse o trabalho da vez – intercalado por outros, é verdade, mas era nossa prioridade. O Faniquito [www.faniquito.com.br] tomou forma, cor e vida – e agora está aí, pra todo mundo.

Minha maior alegria é ver a pequena fazendo de uma conversa na cozinha um novo momento – talvez um começo (sim, temos planos crescentes) de algo que tome vida própria logo mais. Coisa que ela me proporcionou quando apostou em mim, logo após eu levar uma rasteira. É hora de retribuir, sob circunstâncias bastante semelhantes.

Os primeiros passos já foram incríveis – nosso domingo foi surpreendente, acho que talvez resuma minimamente nossa empolgação. Mas esse texto grande, todo pessoal, é para agradecer o apoio de quem de uma forma ou outra contribuiu para que o papo virasse projeto, e o projeto virasse: Thiagão, Ju, Van, Japa, Isa, Aninha, Beta, Mel, Bibi, Carol, Magno, Marly, Nilce e Bassi, minha mãe, Yara, Talitão, Bruna, Fernando, certamente estou esquecendo de mais gente – e principalmente nessas últimas semanas o Glass, que deu uma força ABSURDA pra que o site saísse ainda esse ano. Obrigado mesmo molecada, pois às vezes a gente precisa de um empurrão pra coisa acontecer. Aconteceu. Aconteceu muito, e eu sou grato demais a todos vocês.

Amanhã faço a apresentação pra valer. Hoje é dia de aproveitar a empolgação e curtir o parto.

Meu vídeo do Facebook, ou quase isso

Achei justo usar esse dia 28 – uma Black Friday, segundo os ianques – pra agradecer ao ano que passou, e ainda passa – afinal de contas, ainda faltam 33 dias pra esse cara dar o fora. Melhor me adiantar e fazer isso agora, antes desse recado se perder no meio dos milhares de votos trocados durante a segunda quinzena de dezembro.

Foi um ano intenso, esse 2014: fiquei praticamente sem família em SP; realizei um dos meus 3 sonhos profissionais; lancei um projeto que nem projeto era – e que foi parar no site do meu time, na SporTV, na Record, na Globo, em tudo o que é canto; tive possivelmente minha melhor festa de aniversário (com direito às mais diversas mesas, pessoas, idades e origens); atravessei um oceano pela primeira vez na vida; assisti do estádio do meu time a um jogo de Copa do Mundo; fui chamado pra ser padrinho de um casamento mais que esperado; encontrei e reencontrei muitos amigos; consertei minha geladeira; enfim assisti a um show do Metallica (e sim: do Megadeth também, e por que não dizer que outro do Jorge Ben Jor?); pude cuidar da Pequena – e ela pôde cuidar muito de mim, em mudanças que foram excelentes pra nós dois. Acho que é um belo resumo, pra não ficar me alongando demais nas coisas que aconteceram por aqui. Quem esteve por perto conhece as histórias.

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Óbvio que rolaram problemas, mas deles eu não vou falar. Assim como rusgas, desentendimentos, perdas. Prefiro lembrar do que me faz bem ou que me move, pra fazer disso combustível pros próximos passos. Novamente, não tenho resoluções de ano novo: tenho projetos que começam agora, outros daqui a pouco, e mais alguns que já estão andando. Meu time não foi campeão de nada esse ano – isso também é uma nota negativa. De resto, tá tudo bem.

Portanto, eu queria agradecer a todos que fizeram parte disso. Eu seria muito injusto tentando citar todos, um por um. Mas fiz um apanhado rápido desses momentos que citei – e de outros, que aconteceram por aqui. O ano de 2014 me fez muito feliz em muitos aspectos. Me trouxe muito mais do que tirou. E por ele, eu assino aqui o meu obrigado.

P.S.: Mas prefiro o ao vivo ao virtual. Já tenho cerveja sábado, festa domingo, e aceito todo e qualquer convite de reuniões durante as próximas semanas (e nas seguintes também). Melhor do que ter vivido muito por aqui, foi ter vivido ainda mais fora do perímetro virtual.

Quer que eu desenhe…?

Fim de ano, época de apartheid. Depois do ocorrido (e relatado) no texto anterior, algumas pessoas mudaram radicalmente seu modo de agir comigo. Umas próximas, outras nem tanto. Definitivamente ter um determinado ponto de vista e/ou opinião formada neste momento em especial incomoda (e muito) os que “não estão contigo”. Não dou a mínima – diz a sabedoria popular (sim, ela existe) que a gente só deve discutir com quem tem capacidade de argumentação – coisa que notoriamente alguns agora identificados não têm.

Então tomei uma decisão. Duas, na verdade. A primeira é que durante algum bom tempo me expressarei publicamente sobre questões sérias como um verdadeiro idiota abobado. Melhor ainda: não me expressarei coisa nenhuma. Que se danem os que estão sedentos por algum sentimento de vingança, ou mesmo os ufanistas que a partir de agora estarão cegos por uma razão que não existe. Enquanto as pessoas se sentirem no direito de esfregarem verdades pessoais na cara alheia, eu não farei parte do circo. Me deu bem no saco esse clima de torcida organizada. Não entro mais em guerra. Não perco tempo da minha vida discutindo com quem não me conhece (ou pensa que conhece). Mais: está cada vez mais fácil identificar os babacas – e ignorá-los passa a ser um dever, quase uma demonstração de sabedoria.

Porém, isso é muito cômodo. Então, a tal segunda decisão: vou usar aquilo que tenho de melhor pra tentar fazer algum bem pras pessoas – todas elas. Na minha cabeça, a única forma de nossa espécie evoluir de fato se dá numa equação de três coisas: berço, respeito e educação. As duas primeiras infelizmente não estão ao meu alcance, mas posso dar uma força na terceira. Do meu jeito. Mal não vai fazer se eu tentar, não é mesmo?

Pra fechar o texto (e justificar o que eu farei daqui a alguns dias): na minha opinião, existe uma avalanche de auto-engano acontecendo. Uma caça incessante por “culpados” – uma apontação desenfreada de dedos: “pra você que defende o bolsa-miséria”, “pra você que não liga pra falta d’água de dentro do seu condomínio de luxo”, “pra você que acha bonito passear abraçando outro macho”, “pra você, coxinha que pára seu SUV em fila dupla”, “pra você que defende vagabundo”, “pra você que acha que Miami é a solução”, “pra você que vota em corrupto”. As pessoas fazem o que fazem por motivos próprios (que a gente não entende, porque não dá pra sacar quem é esse cara só olhando perfil e status de facebook – a conta é simples). Porém, não há preocupação em dialogar. Não há vontade de refletir, de apontar os problemas e justificá-los se for o caso, e muito menos de mudar de opinião. Está fácil demais culpar o cara que não veste a mesma roupa, não usa as mesmas cores, não acredita nas mesma coisas, que não tem as mesmas necessidades e preocupações – e que por tudo isso, tem outro ponto de vista. Certo? Errado? Isso é outro problema. É na diversidade que a gente evolui. Sim: as unanimidades são burras, pois não contestam.

Então, antes de apontar o dedo e virar o nariz pro seu ex-querido, pense bem o quão justo você está sendo. Contextos sociais envolvem um todo, e não somente a gente – e por mais absurdo que pareça, tem gente por aí que ainda prefere pensar o todo ao umbigo. Vou tentar fazer algo de bom por aqui – esse é meu compromisso, com o todo. Espero que você esteja fazendo algo de bom por aí também, ao invés de continuar alimentando a cultura do ódio.

E uma úlcera, de tabela. Porque intolerância tem efeito colateral.

Estamos sozinhos

Eu confesso que ainda estou assustado com o que aconteceu domingo. E vou contar uma breve história pessoal, portanto aos que não curtem leituras um pouco mais extensas, sugiro a desistência aqui mesmo.

De 1984 a 1996 estudei num único colégio. Ensino particular, Jardim Aeroporto, frequentada somente por crianças brancas ou orientais, classe média-alta. Não havia um negro sequer em todo o curso, se bem me lembro. E durante todo esse período, não foram poucas as piadas que a gente contava e ouvia – obviamente, também não eram poupados gays, portugueses (dos quais tenho ascendência), japoneses, gordos, nordestinos, loiras e afins. Temos mais de 30, sabemos que época é essa, e o quão comum era se divertir à custa dos outros. Não era culpa do colégio, pois chegando em casa quantas não foram as vezes que meu pai fazia piada sobre os mesmos temas, variando as histórias, e ao final a gente rachava de rir.

Veio o plano Collor, a economia rachou, e no meio da década de 90 tive que mudar de escola. Fui estudar no Senai. Concurso e o escambau, entrei no curso de Artes Gráficas. Uma turma com mais de 70 pessoas. Não tinha um puto no bolso, estudava na Bresser (Zona Leste de SP), morando no Taboão (zona Sul/Oeste), período integral. Ônibus às 4h50, marmita na mala, passei a dividir marmiteiro, mesa e bandeijão com uma galera que em nada lembrava o povo do meu ex-colégio: rico, pobre, gente que morava em outra cidade, gordo, magro, preto, branco, amarelo, órfão, fumante, playboy. E eu, que tomei um choque ali por não saber lidar com as pessoas que não fizeram parte da bolha em que cresci e vivi até então. Foi bom, eu aprendi muita coisa. A turma em 8 semestres encolheu sensivelmente. Existiam caras muito bons, outros nem tanto. Gente que se dava bem dentro da sala de aula, outros que eram mestres na oficina. A gente precisava um do outro no fim das contas. Dei monitoria de matemática, ajudava a galera a fazer pasta de desenho técnico… era outra vida, muito mais suada e cansativa. Mas era um puta de um tesão.

A imagem da minha infância foi ficando turva. Fosse pelo intervalo crescente de tempo, fosse por uma sensação de que aquele cara que eu havia me tornado em nada correspondia ao moleque tímido, inseguro, chorão e mimado que eu era. E havia a vergonha, de muitas coisas: ter preferido escrever a falar com a menina da sala de aula, nunca ter batido uma bola na pracinha em frente de casa, e sim, ter feito e pensado menos dos outros. Aprendi que o certo era fechar o vidro quando o moleque vem vender drops no semáforo, que quando visse um cara na calçada o mais seguro era mudar de lado, e que lugar de nordestino era levantando laje. Aprendi a chamar os caras de bóia-fria, de cabeça chata, de paraíba.

Pois agora eu tinha amigos nordestinos. Viajaria no final do curso pra Porto Seguro. Dali em diante meu mundo abriu. Conheci gente de tudo o que foi canto – pessoal ou virtualmente, e ocasionalmente com um puxando o outro, vieram outras turmas. Tive meus primeiros amigos homossexuais – meninos e meninas. Fiz muita merda. Fiz muita coisa boa também. E em determinado momento eu olhei pra trás.

Assim como fiz ontem.

E senti muita vergonha de quem um dia eu fui. De ter achado graça do ser humano ser o que é. De ter me sentido superior a um alguém qualquer, fosse qual fosse o momento. Até pouco tempo atrás eu chamava sãopaulino de bambi, de “aquela raça”. Que coisa mais imbecil, ser alguém que se diverte fodendo os outros. Ao mesmo tempo, vi vários desses amigos serem discriminados uma, duas, dez vezes. Alguns não podiam o que eu podia – se expressar livremente em público, amar sem ser julgado – pois “a sociedade não aceita”.

“Quem somos?”, essa sociedade… Quem somos nós, que não somos capazes de levar a sério episódios sérios, absurdos, covardes da História de nós mesmos? Quem é essa gente que ainda acha bonito apontar o dedo e diminuir o cara do lado por ele ter uma estrela ou uma cruz penduradas no pescoço? Que pensa que trabalha mais do que o cara que não fala direito o Português, que não tem emprego, que ganha uma miséria do jeito que dá, e que assim como eu e você tem fome, sede, precisa dormir e precisa morar pra não morrer? Quem somos nós pra saber a merda que fulano passou pra ser o que é – e talvez seja o máximo que ela consiga, pois nós mesmos pisamos na cabeça dele pra conseguir subir na vida? Qual o nome do seu porteiro? Da sua faxineira? Será que eles tiveram uma infância tão segura, feliz e tranquila como a nossa?

Não. Você me lê pela internet. Nós somos a exceção.

Então, crescer achando que quem é diferente da gente automaticamente é motivo de piada, de desdém ou de dó… bem, isso é colocar como cláusula pétrea que não somos capazes de pensar além da nossa bolha. É esquecer que viver em sociedade é sim entender a necessidade do outro, de dar bom dia pro cara no semáforo, pro vizinho de banco na padaria, de ser um pouco melhor todo dia. Um dia me botaram uma camisa do São Paulo quando era criança. Mais pra frente, vi que aquilo era errado, procurei minhas cores e fui feliz com meus novos (e velhos) amigos. Não é possível que a gente continue aceitando, calando e empurrando com a barriga nosso estado de letargia com aquilo que não somos, não temos ou não sabemos. Todos (eu disse TODOS) os meus amigos – próximos ou não, minha família, conhecidos e desconhecidos que de alguma forma eu tenho contato são capazes de ser algo melhor. São capazes de pensar com responsabilidade antes de abrir a boca ou mexer os dedos.

Sei que sonhei muito em um dia conhecer um lugar onde o mundo e as pessoas mudaram depois de determinado acontecimento, e tive oportunidade de fazê-lo esse ano. Sou um privilegiado, mais exceção ainda do que antes. Mas o que aprendi por lá todos nós sabemos, ou pelo menos temos uma ideia muito clara a respeito.

Portanto, e fechando a história (e essa reflexão enorme): não existe justificativa, contexto ou o caralho que seja capaz de justificar um sentimento, um lampejo ou um momento estúpido como o que vivemos ontem. Estávamos há pouquíssimo tempo falando de sentimento patriótico, de abraçar a nação, essas coisas que nunca fizemos porque não fomos capazes de nos unir por um bem comum. Ontem soubemos o porquê disso. Então, ao invés de culpar quem se mexeu de alguma forma – indo pra urna, pra rua ou pra onde fosse, vamos nos atentar àquilo que não estamos fazendo direito. E enquanto esse desrespeito, esse sentimento absurdo de superioridade permear de alguma forma a nossa cabeça, não há cor, nome ou região que resolva: estaremos todos no inferno, e sozinhos.

E solidão é exatamente meu sentimento hoje.

Três parágrafos sobre as eleições de 2014

A atual gritaria reflete nossa total inabilidade de raciocínio. Me surpreende a busca desesperada por fatos (verídicos ou não) sobre “a equipe adversária”, tendo como fim reforçar a simpatia – ou enfraquecer a antipatia – por nossas escolhas. Uma pessoa inteligente não toma partido de última hora, nem se deixa influenciar pela onda de boatos do momento. Chega a ser ridículo o bandeirismo, mais até do que normalmente é. Sabemos como funciona o jogo de poder no país, e isso só vai mudar um dia se nossa mobilização for pelo verdadeiro bem comum – e não por aquilo que nos convém, coisa que 9 entre 10 de nós diz que não, mas continua fazendo. Resumindo: é burrice tomar pra si a pureza de uma cor contra outra, sendo que ambas continuam sendo a mesma coisa, em momentos diferentes. Tomar pra si a responsabilidade de acompanhar PRA VALER os candidatos que votamos (elegendo ou não) seria a primeira coisa adulta a ser feita depois desse carnaval todo. Mas nada vai mudar.

E afirmo isso tomando por base outro fato: as pessoas ignoram os absurdos que vieram ainda mais à tona nessa época – tanto em propostas políticas totalmente incondizentes com o nosso momento (o conservadorismo e as promessas “pelo bem da família” – um jeito bonito de se dizer que não são bem-vindos os pensadores, os homossexuais, os alternativos, e todo aquele que um dia tirou a rédea e viu que o mundo é muito mais que ciência exata, ou aquela fantasia escrita nos livros religiosos) como em opiniões pessoais dos amiguinhos afetados. Há espaço para todos sim – até para os que acreditam na tal fantasia: o problema é a insistência de botar o varal no quintal do vizinho, e achar que está tudo bem. Não está. Nunca esteve, e nunca estará. Se por um momento que fosse a gente conseguisse enxergar que o único bem possível é sermos aquilo que julgamos o melhor, respeitássemos as outras pessoas (que têm toda a liberdade do mundo em sair de casa – seja com um terno impecável ou com uma cueca na cabeça – isso não interfere nas nossas habilidades de comer, dormir, atravessar a rua e foder com maestria), a coisa andaria bem. Mas preferimos tolerar o preconceito, o elitismo, o fanatismo e a intolerância para justificar nossas escolhas.

Portanto, dane-se quem vencer essas eleições. Mais do que mudar alguma coisa lá em cima, devíamos mesmo é estar alarmados pela quantidade de coisas que temos que mudar aqui embaixo. Estamos nos mostrando cada vez piores, e pra variar, justificando nosso modo burro e inconsequente de tomar decisões importantes botando a culpa no vizinho. O na Dilma. Ou no Aécio. Ou no PT. Ou no PSDB.

Pra mudar, parte 1: o horário político

Dado que acabou a Copa (rolam lágrimas, rolo no chão de desespero), é hora de pensar no próximo grande evento do país: a tradicional eleição circense nacional. Dada a diarreia de coisas que pipocam por aí, resolvi fazer um negócio diferente, e ao invés de xingar vermelho ou amarelo, propor algumas mudanças no nosso modelo eleitoral e de gestão – que notoriamente está contaminado e cagado. Sendo assim, daqui em diante vou sugerir algumas coisas por aqui. Eu sei que não vai mudar nada, mas dane-se.

Pra começar, por que a gente paga R$300 numa camisa de futebol? Ou R$600 numa bolsa? Porque vendem, e a gente compra. E compra porque há todo um trabalho de marketing por trás desse processo. Pois muito bem: pra gente passar a comprar só o que precisa e com motivos, que tal limar o marketing e nos proteger de produtos defeituosos? Então a sugestão da vez diz respeito ao horário político, que pode funcionar de uma forma totalmente diferente – e muito mais interessante. Oito ítens, um novo cenário. Duvidam?

Foto pra causar polêmica

Foto pra causar polêmica

HORÁRIO POLÍTICO
Segue obrigatório, com uma hora de duração (senão a gente não assiste, convenhamos).

Formato:

– todas as promessas de campanha DEVEM SER CUMPRIDAS, funcionando o próprio horário político como documento de registro. Se elas dependerem “do que o governo anterior deixou”, não devem ser feitas. O não cumprimento dessas promessas acarreta em 4 ANOS DE SUSPENSÃO de qualquer cargo público, sendo O CANDIDATO E SEU PARTIDO INELEGÍVEIS nesse período. Sim, eleição equivale a entrevista de emprego: se você não cumpre, área. Sim, é radical. Mas sim, é pra levar a sério.

– todos os candidatos possuem o mesmo tempo de programa. Quanto mais candidatos, menos tempo (o que leva a disputa a uma possível polarização entre “situação” e “oposição”, com alianças mais explícitas e um menor número de candidatos);

– cenários, vinhetas e jingles são totalmente proibidos. Os candidatos devem tão e somente apresentar suas propostas com recursos audio-visuais semelhantes, num fundo neutro onde consta somente nome e número do sujeito. Sim, a disputa é de propostas, e não de quem gasta mais com marketing. O mesmo se aplica aos debates, que deverão ter presença e participação direta da população em pelo menos dois blocos;

– ataques, comparações e qualquer outro tipo de picuinha é totalmete vetada;

– dado que um cargo público visa O BEM COMUM, não há demérito algum em fulano aderir a determinada proposta de outro candidato. Sim, além de ser mais digno do que copiar e mudar o nome, deixa claro que o candidato possui senso crítico. Não dá vantagem nem tempo extra… só demonstra a humildade que um líder deve ter;

– candidatos a cargos menores devem ter no mínimo um minuto de programa, divididos durante todo o período de campanha. Suas plataformas, projetos e propostas devem constar em site próprio (padronizado entre todos, da mesma forma da propaganda eleitoral), que funcionarão documentalmente como o horário político, e ao final da campanha exibirão um balanço do que foi ou não aprovado, e por quais motivos – facilitando ao eleitor acompanhar o que o seu candidato fez ou não, e servindo de base pras próximas eleições.

– a participação no horário político se restringe aos candidatos, e seu conteúdo é TOTALMENTE VOLTADO às propostas, sem histórico político, pessoal e essas coisas que não fazem a menor diferença depois que fulano assume alguma coisa.

– boca de urna, comícios e afins continuam nos modelos atuais. As imagens dos mesmos são vetadas na propaganda eleitoral.

Bacana?

* E de novo: eu sei que não vai mudar nada – mas enquanto a gente não começar a cogitar novos modelos pros velhos costumes, vamos continuar discutindo vento e não saindo do lugar (que não tá nada bom, e nem apresenta grandes perspectivas). Ao invés de reclamar do vizinho, vamos botar a cabeça pra pensar e achar um raio de uma saída?

Teve Copa, e a gente nela

Calhou da gente assistir à Copa.

Oportunidade de comprar ingressos sem dor de cabeça e por um valor acessível para um evento desse porte, possibilidade de assistir jogos legais, e um bônus: conhecer a nova casa do meu time. Topamos, compramos e escolhemos o jogo – o campeão do grupo de Argentina e Nigéria contra o vice do grupo de França, Suíça e Equador. Por pouco o tal jogo não virou Nigéria x Equador, mas acabou dando a lógica (uma raridade nessa Copa), e fomos assistir aos Hermanos contra os Chocolates.

Antes, um esclarecimento necessário: vivem me perguntando o porquê de eu torcer pra Argentina, já que eles são nojentos, folgados, babacas, etc. A resposta é mais fácil do que se imagina: PORQUE SIM. Na Copa de 90, eu apanhei do meu pai por ter chorado após o gol do Caniggia. A única vez em que ele me bateu na vida. “Não é pra chorar por esse tipo de coisa, é estupidez”, me disse o cara que anos depois, com um comportamento de torcedor digno de um débil mental, me ensinou a odiar o São Paulo FC – o que por si só já justificaria uma reviravolta emocional a fins de provocação, e torcer pros hermanos seria uma resposta à altura ao ato de estupidez DELE. Mas não bastando, eu e a Dé já viajamos pra Argentina por duas oportunidades. Tenho amigos argentinos. Eu amo aquele lugar, por tantos motivos que mal caberiam nesse texto. Eu acredito na força de um continente latino. Eu acho qualquer agressão não-justificada um abuso – o mesmo abuso que eu acabei sofrendo por odiar tanto aqueles caras sem sequer saber o motivo, e que me fez sentir tanta tristeza após um gol. Então sim, eu acho essa rixa uma coisa cretina.

Felizes, partimos aqui de casa logo cedo.

Simulação das nossas vestimentas.

Simulação das nossas vestimentas.

Deixamos o carro próximo ao metrô Butantã, onde o cara do estacionamento – nos vendo devidamente trajados de azul e branco – sentenciou: “tão indo pro Itaquerão né? O jogo é às 13h… vocês tão de volta umas 17h, no mínimo. Eu moro praquele lado e sei como é que é”. Já na estação, a fila pra comprar o bilhete já trazia uma atmosfera muito nova: apesar da tal fila ser enorme, praticamente todo mundo sorrindo. Camisas diferentes, Argentina, Suíça, Brasil, Corinthians, Palmeiras, México, Venezuela (!), gente pintada, gente fantasiada. Aquilo era simplesmente legal. A Dé vira pra mim e fala “eu não manjo quase nada de futebol, mas se isso aqui é Copa, é muito divertido”. Era mesmo. Na minha cabeça veio um pensamento, de que aquela era a coisa mais próxima da utopia chamada paz mundial. Seguimos adiante.

E ao entrar no metrô, começaram os cantos, que nos acompanharam até Itaquera… “Brasil, decime qué se siente / tener en casa tu papá…”. As pessoas no metrô tiravam foto, filmavam, davam risada daquele povo falando alto e rápido aquele espanhol que tanto irrita ao Galvão. Alguns ainda perdidos, pediam informação – eu dei algumas no “meu espanhol fluente” inclusive, e matei um pouco a saudade de lá. No percurso pela linha vermelha do metrô, juntaram-se aos argentinos alguns corinthianos. Sim, porque pra gente, existia esse outro lado: conhecer o estádio que daqui em diante a gente vai chamar de casa. Uma ou outra testemunha suíça, alguns estrangeiros globais, era um trem absolutamente internacional. E divertido, muito divertido. Descemos em Artur Alvim.

Nosso setor no estádio era o Oeste. Dali em diante, andar até nosso destino. No caminho, fomos saudados pela organização (que foi extremamente competente, vale registrar), pelas pessoas na rua (como se fôssemos maratonistas), por um grupo de crentes (e seus cartazes de “Jesus está voltando”)… enfim, por todo mundo. Me vinham à cabeça as palavras do Thiagão duas semanas antes dessa bagunça toda começar:

“Só mais 14 dias… está chegando a hora de ver muito futebol e fazer novos amigos independente de nacionalidade e de qual é o próximo jogo. Aproveitem que vai ser do cacete, e não vai ter outra tão cedo.”

Ele estava certo.

Em pouco mais de dez minutos, chegamos. E eu confesso que devo ter aberto o sorriso mais rasgado ao ver de perto o Itaquerão. Me emocionei mesmo, de dar uma segurada no choro e tremer as pernas. A Copa ao vivo, ali em casa. Eu precisava de uma foto, a Dé tirou, e eu estou com uma cara de idiota feliz da qual muito me orgulho. “Welcome to Arena Corinthians! Bienvenidos a Arena Corinthians”. Sim, Corinthians – e azar de quem não fosse. A Fifa podia dar o nome que quisesse àquele lugar: ele é nosso. E que estádio lindo, Deus do céu… dos acessos à chegada no campo, tudo é muito amplo, muito bonito. É estranho deixar o Pacaembu por um lugar tão diferente, mas aquilo vai ganhar uma alma logo mais que vai sim deixar o lugar perfeito. É inevitável.

Eu, com cara de pateta e todo felizão.

Eu, com cara de pateta e todo felizão.

Lá dentro, a organização era impecável: das indicações aos pontos de venda, o pessoal de apoio, limpeza, tudo. “Você não tá sentindo como se fosse turista?”, a Dé me perguntou. Sim, eu estava. Aquilo era uma coisa diferente de tudo. Entramos e pouco depois já tínhamos uma visão total do gramado. Um céu azul, um calor bem razoável, e tanta gente naquela mistura que a gente só via na TV… era muito, era incrível mesmo.

Ainda faltava uma hora e meia pro jogo, então resolvemos passear pelos arredores. Os stands dos patrocinadores possuíam trocentas atrações – um toque que a Fê nos deu, e fomos conferir. Um clima total de balada, uma galera que notoriamente não era a mesma dos “jogos regulares”, mas a Copa é um ambiente totalmente diferente, e era sim tudo muito legal. Mas era gente demais (mesmo), e numa avaliação rápida, nos pareceu boa ideia irmos pros nossos lugares e esperar por lá o início do jogo.

Cheguei Copa!

Cheguei Copa!

De novo, nenhuma dor de cabeça. Tudo muito organizado – chegamos, sentamos e ficamos na expectativa. Uma multidão de argentinos ao redor, o clima seria o mesmo do metrô – e que bom. Havia uma tentativa da torcida da Suíça de sobressair, e os brasileiros em grande maioria apoiavam os europeus. Mas a torcida azul gritava mais alto, e cantava mais bonito. A nossa tensão nem se comparava à deles, que não erguem a taça há 28 anos – então a coisa era apaixonada mesmo. As equipes saem de campo após o aquecimento, e dez minutos depois toca a musiquinha da Fifa. E a coisa vai.

Selfie, porque tá na moda. Mas a gente tira desde o namoro mesmo...

Selfie, porque tá na moda. Mas a gente tira desde o namoro mesmo…

O jogo vocês viram, eu não preciso comentar. A gente viu tudo muito bem, de trás do gol que fica ao lado direito da TV. Os tais argentinos cantavam, calavam e torciam como gente grande. Obviamente haviam alguns alienígenas ali com a gente (as meninas que usavam um falso nacionalismo pra dar em cima dos hermanos, um casal na nossa frente mais preocupado em buscar cerveja do que assistir ao jogo, um pessoal gritando “senta” a cada levantada da torcida nos ataques… essas coisas de quem acha que está no cinema ou no sofá de casa). Mas nada disso atrapalhou a gente – só o gol que não saía. No tempo normal, e durante quase toda a prorrogação.

Quase.

Câmera mais que exclusiva.

Câmera mais que exclusiva.

Ele existe mesmo. E joga. Muito.

Ele existe mesmo. E joga. Muito.

Acabou 0x0. Todo mundo procurando vida pra mais meia hora.

Acabou 0x0. Todo mundo procurando vida pra mais meia hora.

Pouco antes daquela zona de goleiro dando bicicleta e bola na trave.

Pouco antes daquela zona de goleiro dando bicicleta e bola na trave.

E como foi legal ver o Messi fazer magia no estádio do Corinthians. O gol do di María fez justiça não à seleção, mas à Copa. Disse a Vanessa que “não faria sentido a Suíça passar”. É verdade… os caras ao nosso redor choravam copiosamente, um desabafo que há muito eu não vejo por aqui em Copas – mas que vi muito de perto, dentro minha própria torcida, com a conquista da Libertadores de 2012. Eles estão desesperados, e aquela bola na trave no último minuto quase matou metade do coração. Acabou. A gente tinha visto a Copa ao vivo. Era surreal.

O fenômeno admirando essa Copa, que devia estar dando vergonha, mas tá é muito boa.

O fenômeno admirando essa Copa, que devia estar dando vergonha, mas tá é muito boa.

Porque todo mundo se cumprimentava… todo mundo saía numa boa, camisas vermelhas, azuis e amarelas. Um mundo diferente esse (que eu DUVIDO que aconteceria por exemplo num Brasil x Argentina, com ânimos e rivalidade aflorados de fato). Ainda encontramos o Casper (que eu não via há 15 anos), e foi bom dividir um pouco de tanta alegria com quem havia sentido coisa parecida por outro ângulo no mesmo lugar. Deu tudo muito certo, foi tudo muito bom. A volta, igual à ida, foi em meio a um corredor cercado por moradores e curiosos, que queriam a todo custo uma lembrança do jogo que não foram… uma histeria, um treco totalmente louco. No trem, os argentinos aliviados, e um senhor corinthiano batendo papo comigo fecharam a tampa da panela. Voltamos ao estacionamento às 17h40 – o cara mora lá mesmo, e sabe das coisas. Safadão.

Eu e o Casper, pouco antes de pegar aqueles palmeirenses ali atrás na porrada.

Eu e o Casper, pouco antes de pegar aqueles palmeirenses ali atrás na porrada.

E se existe alguma coisa a mais que possa ser dita, é que no fim das contas não importava a seleção (mas ser a Argentina foi bom, pois a torcida contagiava): a real é que a Copa é uma experiência. As pessoas estão diferentes, o clima é incrível, e a sensação é de viver o impossível. Aquela coisa que acontece dentro da TV de 4 em 4 anos, e que faz o mundo parar, é de verdade. Ter feito parte dela ainda me parece um sonho, e a cada dia eu tenho uma convicção maior de que essa Copa devia ser proibida de acabar. De qualquer forma, da minha vida ela não sai mais.

Um dia você chega LÁ.

A gente deseja e sonha isso. Pra gente mesmo, pra quem a gente ama, pra quem merece. Na maioria das vezes, LÁ é um lugar – senão impossível – dificílimo. Desanima, esquece que sonhou um dia com esse destino, e no fim das contas se acomoda na mesmice. Não dá pra condenar, esse é o caminho que a gente acaba tomando mesmo, porque no final das contas, a rotina – cinza e bege – engole esses sonhos todos, e nem mastiga. Quando não a rotina, o contexto. O mundo. As pessoas. O que for. A vida.

Pois bem. Durante essa última semana, eu cheguei LÁ.

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Pra muita gente, LÁ tem muito dinheiro, iates e mulheres. Acho que LÁ é um lugar tão grande que cada um que chega vê uma coisa diferente. No meu caso, estavam LÁ minha família, meus amigos e algumas várias surpresas. Todos me ajudando, se divertindo, e de alguma forma dividindo essa breve estadia comigo. LÁ é um lugar muito quente, em que eu só cheguei depois de suar muito. Durante a viagem, as noites são curtas, os dias são longos. E obviamente, há obstáculos: aqueles que acham que seu trabalho não vale o que você cobra, aqueles que acham que você não devia cobrar nada, “afinal você está se divertindo”, e uma ou outra lombada que te causa um galo aqui, um hematoma ali. Mas a estrada é longa, e se a gente quer chegar LÁ, pensar que o caminho é de rosas é uma visão muito simplista pra algo tão difícil de se alcançar. Os obstáculos fazem parte, e superá-los é uma obrigação.

Minha parte de LÁ não teve tanto dinheiro. Nem iates. As mulheres foram as que sempre estiveram por aqui: a que me trouxe, a que quis pra si, as que estão sempre por perto. Mas havia muito mais que isso. Chegaram novos amigos. Chegou o time do Corinthians. Chegaram muitas e muitas pessoas me perguntando o que era tudo aquilo. Que era legal. Que eu merecia. Que devia fazer mais. Imprimir. Escrever. Juntar tudo e fazer mais. Disseram que aquilo tudo de fato era pra estar LÁ: os livros, os desenhos, os projetos, os encontros e reencontros, os autógrafos, os comentários empolgados, os palavrões eufóricos, os beijos da criançada, os abraços que não terminam, as lágrimas que deveriam ficar guardadas, pois era hora de sorrir até dar cãibra. E deu. E eu continuei sorrindo.

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LÁ existe sim. E é legal demais, porque você vê que os sonhos têm propósito. Que existem outras trocentas cores nos mais diversos lugares, muito mais bonitas e vivas do que bege e cinza. Quando a gente se aproxima de LÁ, lembra de cada conselho, puxão de orelha, empurrão providencial. Lembra de gente “que foi chata pro teu bem”, “que te disse que ia dar nisso se você não não desistisse”, “que sempre soube que você conseguiria”. O suor vai virando tesão. Você sabe que não errou o caminho. Mais do que isso: você sabe que LÁ não é um lugar só, pois quando se chega, esse lugar muda de nome. Ganha o teu. E você entende muito daquilo que a vida te reserva.

Se dá algum descanso. Dorme sorrindo, sem cãibras. Tem certeza de que a viagem valeu a pena. Mas que LÁ é um lugar pro qual você quer sempre voltar, e ter uma experiência diferente a cada oportunidade. E não há calor, insônia ou lombada que seja capaz de te impedir.

É muito, muito legal isso. E eu desejo, a cada um que não desiste de si mesmo, que chegue LÁ.

*Foi, profissionalmente, a semana mais feliz da minha vida – disparado. E eu queria ser justo e agradecer a cada um nominalmente, mas seria injusto, pois abençoado que sou, foram muitos os responsáveis diretos e indiretos por dois dos meus sonhos – um que sempre tive, e um que nunca ousei – hoje serem memórias. Então, estou tentando de uma forma muito pessoal e discreta agradecer a todos. Obrigado mesmo galera, de coração.

As figurinhas

Era pra ser mais ou menos um presente de aniversário. Eram 23h, o sono chegando, e aquela mensagem lá em cima do Facebook, avisando que faltava uma hora pra vencer a data. O cara é camarada, você não tá muito inspirado pra escrever algo especial, mas odeia quando acontece o inverso e neguinho esquece dos teus festejos. Lembrei da caricatura que tinha do sujeito aqui – que eu fiz pro casamento dele (e que eu mesmo não fui – relapso ao cubo, e uma mea culpa a ser feita pro resto da vida). Aí a lampadinha acende: “cacete, é época de Copa e o amigo é corinthiano (graças ao bom Deus) – vamos fazer uma figurinha”.

Foi coisa rápida, dado que a coleção da Panini vinha embalada. Monta template, iguala os efeitos, encaixa o desenhinho e taí, pimba. Publiquei no Facebook do cara, e ele curtiu tanto que virou sua nova foto de perfil. Me senti honrado, daqueles pequenos prazeres que só quem desenha entende e sabe. Na empolgação, lembrei que não ME desenhava há tempos. Bora fazer uma minha também. Joga no perfil. Like. Like. Like. Like. Like. Like. Like. Faz pra mim. Quanto custa? Também quero. E eu também. Também. Like. Like.

E a tal lampadinha virou holofote.

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Resumindo a história: de um momento de carinho pintou uma baita oportunidade de juntar numa mesma empreitada trabalho E diversão. Sim, porque eu sempre gostei de desenhar meus amigos – a gente curte cuidar de quem gosta, ou estou falando besteira? Mas o engraçado é a coisa ter virado esse tsunami. Porque os amigos dos amigos pedem. E fulano quer uma imagem da família toda, enquanto outro quer dar de presente pro filho a figurinha especial que ainda falta no álbum dele. Uma diversão declarada, que a gente vez ou outra na vida já participou – fosse agora, ou há anos, quando ainda éramos crianças. No fim das contas, e entre tantas preocupações da vida adulta, a gente lembra que o tal espírito que Copas e Olimpíadas carregam é justamente esse – de reunir família, amigos e por alguns minutos, a gente se preocupar apenas em se divertir. Juntos.

Por sorte, acaso ou oportunidade (e quem sabe, uma feliz equação dos três), esse meu álbum tem ganho páginas e páginas de velhos e novos amigos. Com a feliz possibilidade de nunca ser plenamente completado.

*Se você quiser fazer parte desse projeto também, me escreva no [marcelo@masili.com.br]. Inclua os seguintes dados no e-mail: nome que vai na figurinha, time do coração, seleção que será a camisa (pode ser qualquer uma, inclusive de fora da Copa), e data de nascimento completa. Eu respondo, com orçamento e simpatia. Aos que já estão cadastrados: eu monto uma fila por ordem de chegada, e assim que começo a desenhar, envio os dados pra depósito – assim pagamento e trabalho rolam juntos, e todo mundo fica feliz.